Quando comecei esta newsletter, eu tinha uma intenção clara para ela: narrar meus últimos dias com a Preta, minha companheira desde que nasceu. Aos 16 anos, o câncer que a consumia avançava rápido, e eu queria aproveitar o tempo que nos restava.
Preta se foi antes do que eu imaginava, em 16 de agosto, pouco depois do meu único post aqui. Menos de trinta dias depois, dia 10 de setembro, minha outra companheira de 16 anos, a Branca, também partiu. Não escrevi sobre essas partidas aqui, mas os links acima levam quem estiver interessade aos dois poemas de despedida que escrevi para elas. Depois delas, comecei a catar os cacos e retomar a vida, mas os dois lutos e o processo antes deles consumiram muito da minha energia, e acabei deixando este espaço de lado. Apesar disso, nunca deixei de pensar nele e, no último mês, fui dormir quase todos os dias com uma dúvida: o que fazer com esta newsletter?
“Antes do fim” é um nome um tanto apocalíptico, escolhido por conta da partida da Preta que se aproximava. Preta se foi e nós ficamos, mas, assim como ela e a Branca, também teremos um dia o nosso fim — que se aproxima um pouco mais com o avanço da emergência climática e dos novos fascismos pelo mundo.
Depois de pensar nisso um tanto, resolvi retomar este espaço ainda dentro do espírito do nome que escolhi para ele, mas com uma intencionalidade contra apocalíptica: celebrar a vida, a minha, a das pessoas à minha volta, a dos de baixo, a de nós que aqui estamos e aqui lutamos por outros mundos possíveis. No ano em que o Exército Zapatista de Libertação Nacional completa 4 décadas de existência, jogar luz na resistência e nas vidas que teimam em desafiar o fim, pensar para além dele, projetar o pós-derrocada me pareceu uma ideia interessante. Para mim e para quem me lê — ainda que talvez você tenha chegado aqui pelo amor aos bichinhos.
Sendo esse o seu caso ou não, aviso que seguirei falando delas, as companhias animais, porque também elas resistem ao processo de destruição de tudo tocado pelo capitalismo. Não faltarão palavras sobre a Abigail e o Jorge, que também passam pelo processo de luto (a diferença no comportamento dos dois depois da morte das companheiras é clara) e ilustram esta edição da newsletter junto com a Preta e a Branca, mas quero ampliar o escopo: seguir pensando a vida cotidiana, afinal é ela que nos toca a todo instante, mas também a vida futura, a vida desejada, a vida sonhada para depois do fim deste mundo. Porque ele virá, de uma forma ou de outra.
Para começar este novo diálogo, então, deixo uma pergunta (serão muitas daqui para a frente): quando o mundo acabar, estaremos preparados?
Já que citei o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), aproveito aqui para deixar algumas sugestões de leitura sobre o movimento que desde 1994 promove o bom governo na Selva Lacandona, no sul do México.
Se você nunca ouviu falar no EZLN, sugiro este link e mais este aqui.
Se já ouviu mas gostaria de ampliar seus conhecimentos, gosto muito deste livro.
E se você acompanha o EZLN de perto, sugiro ler aqui (em espanhol ou inglês) sobre as recentes mudanças, a morte do Subcomandante Galeano e o ressurgimento de Marcos, agora não mais Subcomandante, mas Capitão Insurgente! São dez partes de um comunicado que ainda está sendo compartilhado aos poucos desde outubro, começando com este poema.
Por fim, aproveito para contar que fui convidado pela sobinfluencia edições para escrever o posfácio de um livro que sairá no ano que vem sobre os zapatistas e o futebol. Aceitei com gosto, porque amo futebol e porque uma das coisas mais encantadoras do EZLN, que me ganhou desde o começo, é justamente o trato com as coisas cotidianas e populares. Ao invés de odiar o jogo, jogá-lo fora, em Chiapas os indígenas e zapatistas resolveram tomá-lo para si, com direito até a desafiar a Internazionale de Milão para um contra!
Esse posfácio será construído a muitas mãos: convidei companheires do União Lapa Foot Ball Club, do Rosanegra Ação Direta e Futebol e do Autônomos Futebol Clube para escrever comigo. Quando estiver pronto, divulgo por aqui =)
O processo todo da Preta e da Branca foi muito custoso. Exames, internações e remédios deixaram uma dívida grande. Dividi tudo no cartão, mas agora a grana acabou.
Por conta disso, estou fazendo uma rifa dos meus livros para cobrir o rombo.
Se você quiser e puder, pode também comprar algum deles para me ajudar. Para saber mais sobre os livros, é só clicar aqui.
E para comprar, rifa ou livros, é só me mandar uma mensagem privada na sua rede preferida (estou nesta e nesta) ou no meu email.
“Antes do fim” se propõe a ser um espaço de debate. Então, se qualquer trecho desta edição te deixou com vontade de falar alguma coisa, é só responder este email ou comentar na página, caso você esteja lendo direto no Substack.
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E se quiser conversar comigo em outras redes, você tem esta opção, esta outra e o meu email
Até a próxima edição!
Abaixo e à esquerda está o coração <3